segunda-feira, 2 de julho de 2007

CONHECIMENTO NUMA PERSPECTIVA HISTÓRICA - Mito, Razão e Ciência

PROCESSO DE CONHECIMENTO

O homem desenvolveu o seu conhecimento por meio da indagação à mitologia de assuntos de ordem natural. "Por que o homem nasce?" "Por que as colheitas se dão após os períodos das chuvas?". Enquanto a mitologia dava respostas dogmáticas, o homem pensante, utilizando-se da observação do mundo e a forma empírica de responder suas questões, ia quebrando as barreiras do dogma e alcançando a plenitude do saber migrando da mitologia à religião e desta à ciência filosófica. Neste processo, mythos e logos se separam, onde o mito fica como personagem histórico, e a razão o agente histórico.

A partir daí o conhecimento vai se desenvolvendo, e no pensamento de Heráclito (544-484 a.c.) onde tudo flui, o conhecimento flui no homem que passa a refletir intrinsecamente e exterioriza através da disseminação das idéias. O conhecimento surge pela capacidade e interesse do homem em filosofar a fim de obter resposta dos fenômenos de sua sociedade e de seu espaço.


O processo do conhecimento gerado pela antiguidade passa a ter, no tempo presente, novas perspectivas. O conhecimento deixa de buscar um sentido para a vida e passa a assumir sua forma aplicada. Do desenvolvimento do conhecimento se exige ação, execução, resultados e benefícios.

O mundo tecnológico e "cientificista" adquiriu novos pensamentos e destes, galgou novos conhecimentos e saberes. Esse conhecimento técnico e científico vem sendo aplicado na sociedade causando sua mudança, fazendo-a rever seus conceitos, sua forma de pensar, sentir e agir. MAS NÃO SERÁ A PRÓPIA SOCIEDADE QUEM GERA ESSE CONHECIMENTO E O APLICA À TECNOLOGIA E À CIÊNCIA A FIM DE SATISFAZER SUAS NECESSIDADES?


A disseminação do saber, que na antiguidade se dava pelas discussões nos areópagos, hoje se faz pela comunicação digital – Globalização. O saber sai dos livros a alcança telas e monitores em todo o mundo em tempo real disponibilizando a todos o conhecimento simultâneo. Essa quebra de limites territoriais promove o estreitamento das relações entre pessoas, povos e culturas. Assim, a aplicabilidade do conhecimento deixa de mudar apenas uma sociedade para promover a mudança no mundo.
No entanto o forte poder tyloriano da busca de resultados, do mecanicismo ainda presente quando se refere à política de mercado mundial de vender e lucrar, passa a formar uma idéia nociva e sua disseminação afeta a vida social ao promover uma cultura superficial, violenta e antiética que se baseia numa perfeição estética, na ascensão social, no individualismo e na falta de compaixão.

O homem vem modificando o seu meio através da comunicação verbal e simbólica, criando assim como o conhecimento, saber e razão, novos mitos (da beleza, da felicidade monetária, do cientificismo). Nesse declínio de valores, se faz necessário no mundo a criação de uma nova concepção ética baseada na nova tematização apresentada pela sociedade atual. No mundo científico já se fala em Bioética, onde a ciência passa a repensar os seus valores e sua missão para a sociedade mundial.

A Sociedade está se transformando continuamente, os antigos valores estão caindo em desuso e há a necessidade de se pensar em novos padrões éticos. Quais seriam as novas verdades da sociedade? Se a ética evolui na busca pela sociedade de uma nova dignidade, onde está esta dignidade para o tempo presente? O que é ético para a sociedade da informação digital?

O MITO EXPLICA O MUNDO: O HOMEM PODE DESCOBRIR UMA RACIONALIDADE DO MUNDO


O mito surge nas civilizações tribais numa forma de explicar um fenômeno que lhes foge da razão. Seria o explicar de algo que não conhece. A uma comunidade tribal o mito não é insignificante ou banal, pelo contrário, sua explicação sobrenatural oferta ao homem à compreensão dos fenômenos naturais, ou até mesmo científicos, dentro de sua realidade, o que lhe tranqüiliza e acomoda, satisfazendo-lhe a curiosidade e livrando-lhe do medo. Além do mais, o mito nestas sociedades promove um modelo exemplar de vida e conduta, quase sempre baseada nas ações dos deuses ou heróis.


Como o mito é uma maneira de se explicar o desconhecido, se faz uso da imaginação, de metáforas e fantasias. Esse tipo de conhecimento gera superstições que com a transmissão por gerações, chega ao status de tradição, formando assim uma cultura. Nessa cultura do mito, se há a comunicação de um sentimento coletivo onde as emoções geradas pelo mistério, fenômeno ou fantasia atingem a toda sociedade. Nisso o mito se torna dogma por fazer parte da essência de um povo, não sendo assim, um objeto de crítica.


"O mito é portanto uma intuição compreensiva da realidade, cujas raízes se
fundam nas emoções e na afetividade
" (ARANHA, Maria L. A. – Filosofando,
introdução à filosofia; 3a. Edição, Ed. Moderna, 2003)

O homem apesar de viver interagindo com a mítica, viu-se em momentos de dúvidas. A mitologia não estava mais acompanhando o desenvolvimento do conhecimento do homem, ficando para traz. O homem pensante começa a perceber as contradições do pensamento mítico o que lhe leva a buscar a compreensão dos fenômenos ao seu redor. Faz-se o uso da reflexão para se encontrar a razão do ser. O homem que começa a viver em cidades, que desenvolve a escrita e o sistema financeiro começa a ver os problemas de sua sociedade e compara-los com a ética de seus deuses e percebe o quão o mundo terreno é diferente do mundo divino.

Nesta compreensão, o universo recebe um caráter dualista onde o bem e o mal ou santo e o profano vivem em conflitos e em lugares opostos. Segundo o historiador e filósofo Cornford, isso ajudou ao homem a desenvolver a filosofia. O mundo terreno passa a ser analisado com uma ótica humana: o fogo, que ates era a manifestação de um deus, agora passa a ser um fenômeno, enquanto ainda se tenha um deus responsável por ele.

A partir desse período (800 a 500 a.c.) o mundo desenvolve o seu conhecimento na compreensão racional da sociedade e da natureza. A razão gera a ciência e esta a tecnologia. Mas ainda no mundo de hoje, o homem não se libertou da mítica, porém não a usa como nos tempos antigos, mas ainda a tem como um ideal.

Percebemos a mítica nos quadrinhos quando a sociedade manifesta o sonho do super-herói que a salvará, ou do físico ideal alimentado pelas celebridades. A sociedade perfeita, defendida por Marx, ou o cientificismo defendido por Augusto Conte. Nossa sociedade ainda guarda tradições de uma cultura mítica, as superstições, crenças em seres transcendentes, ufos etc. QUAL A IMPORTÂNCIA DESSE MITO NA SOCIEDADE DA TECNOLOGIA E PÓS-MODERNIDADE?


O MITO AO HOMEM MODERNO

O mito ainda é bem presente em nossa sociedade como um vestígio de nosso passado teocrático muito bem enraizado graças às induções compulsórias a uma religiosidade a qual não tivemos o direito de optar se realmente a queria para si. Esse mito que deixa de ser enfocado nas lendas e contos populares passa a ganhar um perfil moderno.

Na Segunda Guerra convivemos com o mito da raça perfeita. Nazistas e Fascistas se mobilizam na Europa a fim de desenvolver a cultura de uma supra-racial e uma política econômica messiânica capaz de reestruturar toda a Europa e dominar o mundo. Com esse intuito, o judeu, o negro, o cigano, o homossexual e todos os que não compartilhavas dos ideais nazistas e fascistas foram tidos como seres inferiores, os quais deveriam ser dominados. O mito da nossa raça, ou da raça suprema foi tão nocivo à sociedade que foi capaz de empobrecer a Europa de maneira jamais vista.

Outro mito moderno foi o cientificismo onde dava à ciência o poder de respostas às questões da sociedade. Nesse período se travou uma guerra entre a igreja e a ciência. Isso fez a igreja desenvolver uma ciência crítica literária e usar a arqueologia para provar suas crenças. Essa batalha de provas e contra-provas gerou a produção de várias obras como E a Bíblia tinha razão, do diretor do Instituto de Arqueologia da Universidade de Tel-Aviv Israel Finkelstein.

Atualmente estamos enfrentando várias modalidades de mito: o da beleza, o da força, o do status e o mais nocivo, o do poder. Este mito que sempre esteve presente na sociedade continua em nosso meio. Em períodos posteriores aos conflitos apresenta-se em sua forma atenuada, mas logo revigora suas forças e volta à ativa.

O mito do poder está hoje presente nos conflitos do Oriente Médio. Em meio a uma disputa por terras em que o background é a religião, sua real motivação está no direito de uso da terra, na exterminação do invasor e na demonstração de superioridade em face às demais nações. Para isso se faz valer no desfile de poderes nucleares.

Vimos quanto o mito fora essencial ao desenvolvimento do pensar. O homem pensante assim o é porque em algum momento de sua história resolveu enfrentar seus mitos e medos a fim de repensar os seus problemas e reavaliar suas necessidades. Infelizmente no mundo pós-moderno a consciência mítica não tem desenvolvido o refletir, mas o "des-pensar". Todo o legado científico que o homem adquiriu em sua luta contra seus mitos o fez criar um mito pelo qual luta sem pensar.

Antes voltássemos à mítica medieval e não nos desbravássemos ao oceano desconhecido a fim de dominar terras alheias e explorar a força braçal co-irmãos.